domingo, 31 de janeiro de 2010

Oxigênio em contagotas

          Tenho procurado me libertar. Não que eu faça muita ideia do que realmente prende. Entretanto, algo lateja forte e compulsivamente como se um elástico prendesse meu tornozelo e fizesse com que eu não conseguisse avançar sem retornar. Meu peito tem tido sedes insaciáveis, angústias contidas e palavras repetidas. Mudo-me de cidade, de amores, de vícios, de braços, e minhas mãos continuam as mesmas –  incorpóreas e inquietas. Isolo-me lá e acá, pra tentar despejar as bolhas-pesadas-cor-de-vinho das incertezas. Percebo: meu quente coração não esvai. Estou pedindo, me deixem. Não me procurem, preciso parar de dançar com as mãos dadas em rodas e rodadas de contentamento. Aperto em brisa e tormenta, sim, eu sei que é passageiro e, quem sabe, necessário. Um dia desses, tomo consciência da palavra ser.
          Escolhas repentinas, fracassos repentinos. Lágrimas tremidas, ofegantes, doloridas escorrem pelo dorso, em busca de aconchego. Arrepiam-me, em cada centímetro das queimaduras propositais, das cicatrizes que doem em dias e olhos igualmente úmidos.
         Desculpa, não vivo sem reclusões. Pra mim também não é fácil, não te contar inúmeras aventuras e situações que tenho vivido, e não ter paciência pra te ouvir também. Desculpa, arrebenta os elásticos. Desculpa de reclusão, hermética em mim e nada mais.  

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Acorde sangrando

E o dia amanhece
demoro a acordar.

Rua, continuamente perambulada, sem me oferecer
nada
que diga porque raios eu continuo
aqui, nada
me satisfaz que me acorde
que me suplique
olhos abertos, peito aberto
mente
um turbilhão esticou um fio
nylon transparente, aparentemente - nada

Corta-me, corta-me
sem notar, caminhando
acordo esbarrando, e caio
no nada do parquê do meu quarto

Corda invisível traiçoeira
no chão: eu
Ela, ainda esticada
retirando, roubando-me sangue
equilíbrio entre pedaços de madeira
furtada de mim.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

brisa ausente, preferível

Tentando superar.
concessões por cima.
eu: por baixo, gozando dispensas.

Concessões dispersas
satisfações enganadoras
no depois.

E a dor? Essa, ficou no meio de portas mal fechadas, de noites bem dormidas, e de braços procurados no meio da noite. Ela me segura até o ponto em que a criança fecha os olhos num balanço.
depois,
adrenalina, ansiedade, e
monotonia.

Dispenso-te, saia de meus sonhos inebriantes, escuros e maldigeridos. Os campos, as orquídeas e os irish coffees, precisam ser superados. Calma, eu não falei em nenhum momento, em esquecê-los. Aconteceram, é verdade. Nem parece. Mas veja, não posso mais prender-me em ti. Razões não nos faltaram para o dramático fim. Ou para o sem fim. Entretanto, enxerguemos essa neblina que nos cobre e, essa, não parece mais querer atormentar, e sim, aconchegar. Vamos, pequena, balancemos nossos balanços de olhos bem abertos, corações palpitantes que discernem o vento do embalo, mas também têm a convicção dos pés no chão no parar do balanço.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

"Por veredas de sueño y habitaciones sordas
tus rendidos veranos me acechan con sus cantos.
Una cifra vigilante y sigilosa
va por los arrabales llamándome y llamándome
pero qué falta, dime, en la tarjeta diminuta

Dónde están tu nombre y tu calle y tu desvelo
si la cifra se mezcla con las letras del sueño
si solamente estás donde ya no te busco.
Me diste el frío, la distancia,
el amargo café de medianoche
entre mesas vacías."

Trecho de "Objetos Perdidos" - J. Cortázar