sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Propensa

Na curva do meu ombro não há ninguém descansando.
Forçado encontro
Comigo

Atravesso dias como quem desvia de uma poça e pisa noutra.
Desvio
Deparo
Camuflo-me como quem desvia de uma poça e pisa noutra.
(forçado encontro)

Desenvolvo diálogos, na pretensão de afastar-me.
Percebo-me, então
Seduzida por minhas próprias palavras diminutas
E pela – proposital - falta de pontuação.

Mas.
À noite,
A camuflagem não me satisfaz.
Não encontro poças para evitar
Nem diálogos convincentes.

Mergulho, então, nua
Revelada
Sem forças para fugas
Lentamente, intensos vínculos diluem minha solidez.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

"Silêncio de resposta e sangue ainda
os vidros soltos sobre a cara
mesmo sem saber que retornamos
saibamos que o espelho que desaba
fere e contunde a nossa cara."
(Ana C.C.)

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

bolhas coloridas fritando no amarelo do óleo azul.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Até então

Até então, um dia normal. Acordei tarde, não conseguia abrir os olhos, não conseguia fazer nada, até que tomei duas xícaras de café. Entre uma xícara e outra, decidi massacrar a sonolência e optar pela vida. Muito quente na rua, daqueles dias que não se pode pisar fora de casa sem sentir uma preguiça morna que arde a testa e contrai as pálpebras. Decidi tomar um banho bem gelado. Botei vestido – porque nesses dias, não dá nem pra imaginar estar de calça –, e então fui com minha mãe almoçar em um restaurante perto. Até comentei o quanto achava arriscado andar de vestido em Osório, já que tem muito vento, e eu, descuidada, acabava por mostrar minhas perninhas e bordas de calcinha por aí. Na volta pra casa, o calor continuou molhando meu corpo e secando meu cérebro.
Sentei no sofá, e tomando café , arpejei algumas músicas no violão. Até que a mãe se despediu, dizendo que estava na hora de ir pro trabalho, e que eu ficasse bem.
Consumidos - pelo relógio ao modelo rodoviária que está na lareira – ao menos dez minutos, o celular toca, e num desespero, a mãe pede para que eu recolha i-m-e-d-i- a-t-a-m-e-n-t- e a roupa que secava na rua, porque chegava um ciclone em Osório. Ao desligar, atirei o celular em qualquer lugar, chequei se a gata estava bem, e me encaminhei apressadamente para a parte de trás do terreno. Recolhi as roupas, e as despejei em uma poltrona da sala. Resolvi conferir a peça de trás. Já no lado de fora, um lúcido caminhozinho de perfeitos quadrados de alguma pedra cinza cortava o gramado ligando casa e peça. Dirigi-me então, para lá (portas e janelas de vidro. Dentro, churrasqueira, mesa, cadeiras e fogão). As portas estavam fechadas e tremiam como se fossem regurgitar uma enorme e pegajosa bola de pêlo. Continuei assistindo, até que pesadas e velozes gotas de chuva começaram a esfaquear-me em todas as direções. Quando já me voltava para o interior da casa, vi uma cena monstruosamente inesperada: aquelas portas de trás abriram-se furiosamente com o vento ainda mais furioso. Sim, elas estavam trancadas à chave. Havia um incrível mecanismo em que uma barrinha de ferro entrava no chão trancando-a, e na parte de cima, outra entrava no teto. Mas elas estavam trancadas apenas na maçaneta. Corri para tentar fechar aquelas desgraças, e a ventania me carregava para todos os lados.

Enquanto eu puxava uma porta para tentar fechar o milagroso pino de baixo, a outra vinha com força contra minhas costas, ou contra a parede, fazendo um estrondoso barulho. Pensei que a porta poderia quebrar-se a qualquer momento se eu não conseguisse cumprir minha desesperada tarefa. Eu apanhava de portas, ventos e chuva. E então recordei de um filme em preto e branco que se passa na noite da revolta estudantil de 1968 em Paris, onde grande parte dos estudantes vira carros de lado, para abrigar-se das tropas militares, e de lá, só conseguem enxergar fumaça de bombas e a imensa escuridão noturna. Provavelmente eu tenha lembrado isso quando percebi que meus óculos estavam embaçados e cobertos de gotas d’água.
Tendo em mente que as portas tinham sido estupradas pelo mau-tempo, rodar a chave somente na maçaneta não adiantaria. Então me agachei, na tentativa de fechar os pinos de baixo. A tempestade continuava irritadíssima. Meu vestido levantava bruscamente. Novamente, fui assediada por pensamentos inoportunos. Dessa vez, me vi cantando Gloria Gaynor no meio da chuva e da ventania. Obviamente, imaginava o glamoroso single “I Will survive” em meio a luzes coloridas, fumaças, lantejoulas e plumas rosas. Tudo voava na direção que o vento quisesse (provavelmente um vento daquele dirigir-se-ia para algum lugar semelhante ao inferno).

As bordas, costuras e tecidos, da minha calcinha já estavam completamente à mostra, e os cabelos me chicoteavam o rosto. E aquele vidro me derrubando com força. E o pino não funcionando. E a ventania, e o céu negro, e o uma tampa de qualquer coisa voando – devia ser da vizinha, coitada. Mas de qual delas? E que tampinha tenebrosa, o que será que permite ser tampado com isso? – e a chuva forte e gorda. Meus pés num chinelo escorregadio. Uma tormenta. O dia certamente estava insatisfeito com alguma coisa.

Litoral gaúcho hoje à tarde:

Chuva torrencial acompanhada de ventos fortíssimos (estima-se que chegaram a cerca de 140km/h).

Preciso dizer que uma das ruas principais de Osório se enfeitou para o natal essa semana, distribuindo nos postes de luz grandes anjos dourados, com fios luminosos entre os braços, com as cabeças baixas, e logo acima, suas auréolas placidamente instaladas sobre fios amarelos-ouro. E preciso acrescentar, que dois desses anjos caíram na tempestade.Um deles destruiu um carro.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Imprecisões exatas

E começo a acreditar em alguma coisa que ainda não consigo definir o que é, se pudesse senti-la, seria macia e densa, como uma esponja espumando bolhas-brancas-pesadas. Uma vontade que agoniza (mesmo sem saber por que agoniza, e por que é vontade).Seria a esperança de desejar? Talvez uma ilusão incapaz de enganar-se... (Quanta incompletude!)

Olhei para uma tríade capaz de formar um Si: estava feito o acorde completo e composto por três notas logicamente manejadas. Não eram apenas notas. Uma vez juntadas e norteadas por um tom, tornavam-se perfeitamente e incontestavelmente um acorde.

Impreciso são meus olhos e são meus cegos engasgos. Imprecisas são minhas percepções. Tão grudadas em desejos e incertezas , que talvez sejam um pouco de cada.

(Não faço ideia do que realmente espero, mas noto que espero...e.es.esp.espe.esper.espero)

Hoje um pássaro pousava convicto em um arbusto. Não ficou ali por mais de três segundos. Freneticamente olhou tudo ao seu redor - e já impulsionando o arbusto para baixo -, cantarolou qualquer canção. As notas de sua melodia expandiram e perderam-se no ar enquanto ele (por consequência do êxito no impulso aplicado) ganhava altura e velocidade. Naqueles instantes, o arbusto, a cantoria e o até mesmo o ar fora seu. Um momento denso e macio agonizou freneticamente com o seu vôo.
Ele não soubera o motivo pr’um impulso -, nem tampouco o que aguardara por menos de três segundos -, mas conquistara com esse movimento um acorde perfeito.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Feixe de luz

A piscina era enorme, e meus pés se aproximavam dela.
De noite a água é mais convidativa.
No morno da madrugada, mergulhei no escuro. Meus pés envolviam-se em densas massas de água em movimento. Eu não me importei com a ardência da água, ofereci meus olhos à piscina, mas a obscuridade predominava. Eu seguia nadando, meus cabelos bailarinos arrastavam-se numa valsa compassada enquanto meu nado percorria o espaço, a procura de. Num instante de lume, em uma pequena área, a luz penetrava a superfície e chegava ao fundo, mas não com muita eficácia. Vendo isso, procurei me movimentar na direção daquela luz, com o fim de. Mas meus braços se chacoalhavam e minhas pernas esperneavam bruscamente, e eu não ganhava movimento. A partir disso, resolvi conferir que diabos acontecia. Foi quando notei: meu corpo se encontrava boiando, meus pulmões estavam sem ar e meu rosto devia estar provavelmente roxo. Odiava esses momentos, em que algo interessante pousava perto, entretanto algum inconveniente vindo de mim mesmo, impedia-me de chegar ao meu objetivo. Emergi para o ar fresco da noite quando cedi aos infortúnios do sistema respiratório, tirando humildemente a cabeça da água. Respirei fundo três vezes – diziam que três era um bom número -, tratei de guardar ar, prendê-lo, e mergulhar novamente. A luz ainda estava lá: plácida e paciente. Ela percorria na diagonal, e linearmente perdia sua expressão. Era alaranjada e me parecia ainda mais convidativa do que a própria piscina, em meus devaneios noturnos. Nadei até lá, tentei tocá-la e ela me iluminou, um brilho singular se fez em minhas mãos. Eu estava no meio da piscina, na metade da profundidade que ela oferecia. Num repente resolvi descer à máxima profundidade, sentar-me ao fundo e contemplar aquele fenômeno. De baixo, só havia esse feixe iluminado. Não era como mergulhar de dia e encontrar milhões de linhas de luz movimentando-se e contorcendo-se. Voltei à minha tarefa, e finalmente sentei no chão ladrilhado. Era mais frio e ainda mais escuro lá embaixo. E era o máximo que eu poderia me aventurar, ali acabavam minhas possibilidades, e a luz já não me alcançava perfeitamente, apenas podia ver através dela algumas micro-partículas passearem.
Já me levantando do chão, com a respiração comprometida, soltei algumas bolhas de ar e fiquei olhando. No que a última bolha explodiu, misteriosamente a luz apagou. Meu deus, a luz apagou, meu surpreso e único interesse naquela noite havia desaparecido! Sem palavras, e já sem fôlego nadei até a superfície, meu coração batia forte, minha respiração intensa e cansada se recuperava. Olhei pra todos os lados, não vi ninguém, nem algum vestígio de luz. Concluí que deveria sair daquele lugar, trocar de roupa e me conduzir para.